40% dos partidos descumpriram cotas no horário eleitoral em 2024

Monitoramento liderado pela UFG mostra que homens têm 2,5 vezes mais chances que mulheres na eleição às Câmaras Municipais
Por O Popular
Data: 02/10/2025
Angelita Pereira de Lima, reitora da UFG e uma das coordenadoras do projeto De Olho nas Urna: desigualdade de gênero no horário eleitoral (Fábio Lima / O Popular)

Nas eleições de 2024, 40% dos partidos políticos descumpriram as cotas de gênero e de raça no Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral (HGPE) em emissoras de televisão, com as mulheres sendo majoritariamente preteridas no horário nobre e com impacto negativo para candidatas às Câmaras Municipais. É o que mostram resultados do projeto De Olho nas Urnas -- candidaturas de mulheres e monitoramento da igualdade de gênero nas eleições de 2024, pesquisa coordenada pela Universidade Federal de Goiás (UFG).

Na prática, eles têm 2,5 vezes mais chances de serem eleitos do que elas, o que reflete a persistência de barreiras estruturais de gênero na política brasileira, indica o levantamento.

O HGPE foi monitorado diariamente em todos os períodos, durante toda a propaganda eleitoral do ano passado, nos nove colégios eleitorais de maior densidade populacional nas regiões: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Fortaleza, Salvador, Recife, Curitiba, Goiânia e Manaus. Esse monitoramento gerou um banco de dados com 35.989 observações.

Entre esses dados, a pesquisa mostra que dos 19 partidos nesses municípios, pelo menos 12 descumpriram a proporção de tempo em mais de 40% das cidades, com destaque para PL, PV e MDB (78%, 63% e 56%, respectivamente). Dos partidos representados em todas as capitais avaliadas, somente a Rede não descumpriu a proporção de tempo de HGPE.

O foco do projeto foi nas eleições ao Legislativo, e não na disputa para prefeituras, devido às leis de cotas apenas para candidaturas proporcionais, explica a atual reitora da UFG, Angelita Pereira de Lima, uma das coordenadoras do projeto, junto com Najla Frattari, doutora em Ciências Sociais.

A determinação legal é de no mínimo 30% e no máximo 70% de candidaturas para cada gênero. A lei brasileira prevê ainda a obrigatoriedade de que o tempo destinado às mulheres e às pessoas negras na propaganda eleitoral -- em TV e em rádio -- seja proporcional à presença dessas pessoas nas chapas partidárias. Portanto, essas duas regras em conjunto obrigam os partidos a destinarem o mínimo de 30% das candidaturas e de tempo de propaganda às mulheres.

A pesquisadora Najla observa que os dados evidenciam que o aumento de 10 segundos da presença de mulheres no horário nobre, entre 18 horas e meia-noite, aumenta em 12,8% a probabilidade de uma candidata ser eleita. Já no quadro geral, o aumento de 10 segundos no tempo de propaganda acresce em 0,6% as chances de eleição.

Ou seja, reforça Angelita, "são dados consistentes para pensar pelo menos no cumprimento da lei de cotas como absolutamente necessário". Ela enfatiza que a influência do HGPE é mensurável e interfere no sucesso das candidaturas.

"A pesquisa mostra descumprimento das cotas e discriminação de gênero na faixa de horário nobre, com prejuízo para as candidatas." A reitora ressalta ainda que partido que cumpre cotas elege mais do que o que não cumpre, cuja taxa de sucesso eleitoral geral é 1,19% menor.

Método inédito

O projeto, iniciado em 2023, teve duas etapas. A primeira consistiu em levantamento dos dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) referentes a vereadoras eleitas em 2020. "Buscamos entender os resultados, segundo os quais a mulher tinha quase três vezes menos chance de se eleger que um homem", comenta Angelita.

Ela menciona informações que contribuem para analisar o processo eleitoral como um todo. Cita, por exemplo, como os TREs (Tribunais Regionais Eleitorais) avaliaram fraudes por não cumprimento de cotas, e que apenas 32% são relatoras. Também lembra que de 1.657 processos de fraudes, apenas 11 referem-se a violência política de gênero.

Uma das vertentes do projeto foi a análise de notícias sobre violência política de gênero em 12 sites de jornalismo, entre os mais acessados e de espectro variado. De 2.075, foram 175 notícias sobre essa questão.

"Quanto mais perto do pleito, maior a ocorrência. A violência política de gênero vai se intensificando à medida que a campanha avança: psicológica e simbólica, 69%; econômica, 13%, física, 10%, e inclui feminicídio e tentativa de feminicídio", comenta Angelita.

O método inédito do estudo incluiu, além do monitoramento em tempo real da propaganda eleitoral gratuita em 2024, a criação do Índice de Equilíbrio de Gênero (IEG). O novo índice demonstrou que, entre 2020 e 2024, as eleições municipais registraram um crescimento modesto na participação feminina.

As mulheres passaram de 34,6% para 35,3% do total de candidaturas a vereadoras. A taxa de sucesso para elas aumentou de 5,5% para 7,2%. No entanto, os homens mantiveram vantagem expressiva, com taxas de sucesso de 15,2% (2020) e 17,6% (2024).

O IEG confirmou que, em 2024, nenhum estado brasileiro alcançou equilíbrio na representação política feminina. O Rio de Janeiro apresentou o pior IEG entre as candidatas (-0,35) e entre as eleitas (-0,82), enquanto o Amazonas teve o melhor desempenho entre as candidatas, ainda assim negativo (-0,21).

Em relação ao número de candidatos em geral e dos eleitos, homens e mulheres, tanto em 2020 quanto em 2024, o menor índice de desigualdade foi no Piauí e o pior no Rio de Janeiro. Goiás aparece na 18ª posição quanto ao número de eleitas.

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