Projeto de zona franca com cidades goianas gera embate

Criação de área com incentivos fiscais no Distrito Federal, que inclui 29 municípios de Goiás, avança e passa a ter oposição de deputados do Amazonas
Por O Popular
Data: 06/05/2025
Deputado federal José Nelto: proposta de nova zona franca quer incentivar desenvolvimento regional no Entorno (Bruno Spada/Câmara dos Deputados)

Após seis anos de tramitação, o projeto que pretende criar aZona Franca do Distrito Federal teve avanço na tramitação na Câmara dos Deputados e gerou reação junto à bancada do Amazonas. A proposta tem autoria do deputado goiano José Nelto (UB) e passou por análise prévia na Comissão de Finanças e Tributação, que solicitou parecer da Comissão de Indústria e Comércio. Opositores à ideia, no entanto, trabalham para arquivar o texto logo e impedir votação em plenário.

O projeto de lei foi apresentado ainda em 2019 e prevê a criação da Zona Franca do DF a exemplo da que já existe em Manaus (AM) desde 1967. O texto teve aprovação pela Comissão de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional (Cindre), antes de caminhar para o colegiado de Finanças.

Apesar da intenção de ampliar o desenvolvimento econômico e geração de receitas em região historicamente carente do país, deputados do Amazonas avaliam que os novos benefícios fiscais regionais poderiam representar uma ameaça à Zona Franca de Manaus.

"Tenho o maior respeito pelos deputados do Amazonas e a intenção não é acabar com a Zona Franca de Manaus. Minha proposta é fazermos um texto para industrializar o entorno de Brasília, com Goiás e parte de Minas Gerais. Não nos mesmos incentivos fiscais ou os mesmos valores que tem na Zona Franca de Manaus. Não vamos concorrer com Manaus e nem vamos tirar uma indústria sequer de lá", afirma Nelto.

A bancada nortista avalia que a situação do planalto central é diferente da vivenciada por Manaus nos anos de 1950, quando o governo federal buscava formas de melhor ocupar o território nacional, em especial na floresta amazônica, para incentivar seu desenvolvimento e comércio .

A nova Zona Franca abrangeria o Distrito Federal, além de 33 municípios goianos e mineiros, com isenções e benefícios que vigorariam por 25 anos a partir da aprovação da lei. O texto propõe a inclusão dos mesmos 29 municípios de Goiás e quatro de Minas Gerais que compõem a Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno (RIDE). Segundo o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2022, a região tem cerca de 4,5 milhões de habitantes.

Os municípios em Goiás são Abadiânia, Água Fria de Goiás, Alexânia, Alto Paraíso de Goiás, Alvorada do Norte, Barro Alto, Cabeceiras, Cavalcante, Cidade Ocidental, Cocalzinho de Goiás, Corumbá de Goiás, Cristalina, Flores de Goiás, Formosa, Goianésia, Luziânia, Mimoso de Goiás, Niquelândia, Novo Gama, Padre Bernardo, Pirenópolis, Planaltina, Santo Antônio do Descoberto, São João d'Aliança, Simolândia, Valparaíso de Goiás, Vila Boa e Vila Propício. Já em Minas Gerais, seriam as cidades de Arinos, Buritis, Cabeceira Grande e Unaí, no noroeste do estado.

O deputado amazonense Pauderney Avelino (UB-AM) pretende assumir a relatoria do texto para derrubar a matéria. "Vou esperar o PL que cria uma nova Zona Franca no Distrito Federal chegar na Comissão de Finanças e Tributação (CFT), da qual sou membro, para pedir a relatoria da matéria. Além de não haver previsão orçamentária para esta renúncia fiscal, o projeto não está em acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal. Trabalharemos para que esse PL não passe desta comissão", disse o deputado ao Correio Braziliense.

A bancada amazonense reforça que a falta de estimativa sobre a eventual renúncia fiscal seria fatal para o avanço do texto. O projeto de Nelto apenas determina que o Poder Executivo deverá estimar o montante da renúncia fiscal e realizar a inclusão dos valores no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA).

Na justificativa do projeto, o deputado goiano aponta que a Zona Franca de Manaus é uma "experiência muito bem-sucedida na busca de novas estratégias de desenvolvimento regional no país". Argumenta ainda que, desde então, houve poucos avanços no desenho de novas políticas de desenvolvimento regional e que o projeto seria um caminho para o desenvolvimento econômico da região do DF.

"Não tem essa previsão da renúncia, mas é porque agora é que nós vamos construir um texto para saber o impacto da medida. Além disso, tem também a questão da reforma tributária, que precisa ser considerada. Tudo isso nós ainda vamos discutir e adequar o texto. O que não dá é que os deputados venham com os dois pés no peito dizendo que não vão aceitar. A palavra final não é da bancada do Amazonas e temos que discutir. Eu não quero prejudicar", afirma Nelto ao POPULAR.

O deputado goiano ainda diz que o debate sobre o projeto de 2019 também é oportunidade para que o Congresso realize a rediscussão da Zona Franca de Manaus. "Temos três unidades da federação envolvidas: o estado de Minas Gerais, Goiás e o Distrito Federal. Eu estou aberto para conversar. Agora, dizer que não vai aceitar, não é assim. É hora de ter o debate. É o momento de rediscutir o pacto federativo da Zona Franca de Manaus também. Por que só pode ter lá? Nenhum outro estado da federação pode ter? Lá é o modelo, nós podemos adotar outro modelo", afirmou Nelto.

Histórico

A discussão sobre a Zona Franca de Manaus foi iniciada ainda em 1951, com projeto do então deputado federal Francisco Pereira da Silva (1890-1973), que propunha a criação de um porto franco na capital do Amazonas. A ideia da Zona Franca, no entanto, só foi concretizada em 1957, por meio de outro projeto, aprovado pelo Congresso e sancionado pelo então presidente Juscelino Kubitschek.

Houve ampliação em 1967, para que a região se tornasse um centro industrial, comercial e agropecuário dotado de condições econômicas especiais. No ano seguinte, os benefícios foram estendidos aos bens e mercadorias fabricados na zona.

O prazo original da vigência da Zona Franca de Manaus era até 1997, mas nos anos 1980, foi prorrogado por mais dez anos. Uma nova prorrogação foi definida pelo Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição de 1988. Em 2014, a vigência foi novamente prorrogada, desta vez por mais 50 anos, o que amplia a validade para 2073.

Procurado pela reportagem, o governo de Goiás, por meio da Secretaria de Indústria e Comércio, apontou como positiva a iniciativa de buscar o desenvolvimento regional na região do entorno do DF, mas indicou restrições quanto à constitucionalidade da proposta. A pasta afirmou que deve elaborar um posicionamento oficial sobre a matéria na Câmara, mas não enviou a manifestação até o fechamento desta edição.

Ícone Mais Notícias
Esteja sempre atualizado sobre os principais acontecimentos