
Uniformes que estavam em galpão valem R$ 3,2 milhões

As peças de uniformes escolares encontradas em um galpão alugado pela Secretaria Municipal de Educação (SME) de Goiânia durante vistoria pelo prefeito Sandro Mabel (UB) estão avaliadas em R$ 3,25 milhões, conforme levantamento feito pela reportagem com base no contrato firmado sem licitação em outubro de 2021 com uma empresa de Guapiaçu (SP). O valor representa 17,6% do total contratado. Na época, a SME havia adquirido, por R$ 18,4 milhões, cerca de 108 mil kits de uniformes escolares para o ano letivo de 2022.
A gestão do prefeito Rogério Cruz (SD), que antecedeu a de Mabel, foi marcada por atrasos nas entregas dos uniformes aos alunos matriculados na rede municipal de ensino. Os kits adquiridos em 2021, por exemplo, previstos para o ano letivo seguinte, só começaram a ser entregues a partir de agosto de 2022. Naquele mês, a reportagem fez matéria mostrando o atraso sem que fosse dada uma justificativa para a demora. Além disso, em julho do mesmo ano, o contrato com a empresa, chamada Grupo Método, teve um aditivo no valor para aumentar o total de kits repassados.
No material deixado no galpão estão 19,2 mil pares de tênis avaliados em R$ 1,15 milhão e 14,1 mil jaquetas avaliadas em R$ 713,5 mil. Esses valores levam em conta o preço que consta no contrato de 2021, sem atualização monetária. Se for levar em conta o percentual em relação à quantidade de peças contratadas, o que teve maior acúmulo são as bermudas masculinas (46,6%) e os tênis (35%). No portal de transparência da Prefeitura consta que a empresa paulista recebeu integralmente o valor contratado, de R$ 15,6 milhões, mais o aditivo de R$ 2,9 milhões.
Na manhã de 29 de janeiro, com uma equipe da SME, Mabel fez uma inspeção nos galpões alugados no Setor Santa Genoveva desde 2016 junto à empresa Queluz Empreendimentos. A reportagem já havia mostrado, em reportagens de 2023 e 2024, que a Prefeitura usava os espaços para guardar entulhos e materiais inservíveis. A secretaria dizia na época que também armazenava nos locais livros, material de reposição para as unidades de ensino e kits de uniformes, mas quanto a esse último item não informava que já deveriam ter sido distribuídos nem o volume estocado. O contrato de aluguel desses galpões, avaliado em R$ 112 mil por mês, será rescindido após o esvaziamento completo dos espaços.
Quando o jornal abordou o atraso na entrega dos kits do Grupo Método, em agosto de 2022, a Prefeitura justificou a falta de licitação alegando questões de agilidade e economia. A adesão foi feita junto a um pregão presencial realizado pelo Consórcio Público Intermunicipal de Inovação e Desenvolvimento do Estado de São Paulo (Cindesp). A reportagem chegou a procurar o dono da empresa na época, Paulo Rogério Szimkiewicz, mas ele bloqueou o contato com o jornalista. Em dezembro de 2022, o grupo foi repassado a outros empresários e transferido de cidade.
O Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás (TCM-GO) chegou a apurar em 2022 uma denúncia relativa à aquisição dos uniformes junto ao Grupo Método, porém não viu nenhuma irregularidade. Um acórdão determinando o arquivamento do processo foi aprovado nesta quarta-feira (5).
Todos os contratos para compra de uniforme firmados na gestão de Rogério foram por meio de adesão à ata. Entre 2021 e 2024, passaram pela SME cinco secretários. A última aquisição, em fevereiro do ano passado, foi feita junto a uma carona no pregão feito pelo Consórcio Intermunicipal Dom Mariano (Condomar), de Pernambuco, por R$ 26,5 milhões. Ao contrário do que aconteceu nos contratos anteriores, esses kits foram distribuídos diretamente às escolas pelas empresas contratadas. Parte vai ser usada pelos estudantes do ano letivo de 2025.
Os uniformes encontrados em um dos galpões do Santa Genoveva foram deixados nas Coordenadorias Regionais de Educação (CREs) da SME para serem buscados pelos diretores das unidades de ensino. Serão entregues prioritariamente para alunos novatos. Além desses, há nos almoxarifados uma reserva técnica de camisetas referente a um contrato de 2020 e de outras peças adquiridas nos contratos assinados em 2024. Atualmente, a rede municipal de ensino em Goiânia conta atualmente com 113,5 mil alunos matriculados, sendo 67% deles no ensino fundamental.
A compra de uniformes para entrega gratuita a todos os estudantes da rede municipal foi iniciada no último ano da gestão do prefeito Iris Rezende, em 2020, para início do fornecimento em 2021, já na administração de Rogério. Naquele ano, os alunos receberam os kits no começo do ano letivo. Em 2022, foi a partir de agosto. No ano seguinte, entre março e abril. E em 2024, no final do primeiro semestre. Pais dos alunos afetados pelos atrasos afirmam que o problema gerou custos extras para as famílias, que acabavam tendo de comprar roupas para os filhos irem às aulas.
Não é 'razoável'
O vereador Wellington Bessa (DC), que era o titular da SME na época da aquisição dos uniformes do Grupo Método, comentou não considerar "razoável" o armazenamento de bens e serviços "pelo tempo mencionado em tela", mas destaca que não foi o único gestor da pasta na administração passada. Bessa deixou a secretaria em junho de 2023. "A determinação como titular da pasta, à época, era que os bens e serviços contratados deveriam ter as suas destinações conforme cronograma estabelecido pelas unidades técnicas, de acordo com as respectivas demandas."
Bessa também argumenta que o volume e especificação das aquisições são definidos pelas unidades técnicas da SME e que nas aquisições de uniformes observa-se o número de estudantes na rede, resguardando-se uma reserva técnica para utilização futura. "Não posso opinar em decisões advindas de gestões subsequentes à minha, especialmente sobre novas aquisições e análise de material em estoque", afirmou ao jornal.
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