Emendas liberam prédios em áreas antes proibidas em Goiânia

Propostas à lei de Habitação de Interesse Social modificam outras legislações e permitem adensamento na Avenida Fued Sebba, região da Perimetral Norte e até Setor Sul
Por O Popular
Data: 04/07/2024
Emendas permitem adensamento populacional em áreas antes não autorizadas, como na Avenida Fued Sebba, no Jardim Goiás (Wesley Costa/O Popular)

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Municipal de Goiânia rejeitou os vetos do Paço Municipal à Lei Complementar 379/2024, que disciplina parâmetros urbanísticos das Habitações de Interesse Social (HIS). Com isso, as alterações que foram propostas pelos parlamentares a outras leis, como o Plano Diretor (PD) de Goiânia e a Lei de Vazios Urbanos, por meio desse documento, podem passar a vigorar. A rejeição ainda vai ser votada em plenário. Entre as mudanças está a permissão para o adensamento ao longo da Avenida Fued Sebba, entre os setores Leste Universitário e Jardim Goiás, e a prorrogação por dois anos da validade do Alvará de Construção dos projetos aprovados antes da validade do PD atual, que começou a vigorar em setembro de 2022.

O Paço Municipal já tinha acatado, na sanção da lei, outras mudanças ao PD, como em relação a Outorga Onerosa de Alteração de Uso (OOAU), que permite a alteração no uso do imóvel, passando de rural para urbano. Sobre esse assunto, houve veto, com a rejeição da CCJ, sobre como seria o método para a permissão de construção de empreendimentos em parte da área, enquanto o restante seguiria com a necessidade de liberação, mas sem a necessidade de nova avaliação técnica. Também já havia sido sancionada a permissão para a construção de Projetos Diferenciados de Urbanização (PDU) em áreas de vazios urbanos do Setor Sul, na Área de Entorno ao Bem Tombado ou na Área de Desaceleração de Densidade, o que ficou proibido na Lei de Vazios Urbanos, sancionada em janeiro. O próprio PD já classifica como proibida a construção de PDU em áreas do entorno de bens tombados, o que torna um contrassenso a sanção da emenda.

Autora da emenda sobre a Avenida Fued Sebba, a vereadora Sabrina Garcez (Republicanos) conta que chegou um questionamento a seu gabinete sobre o adensamento na via, o que ela respondeu ser proibido. No entanto, a parlamentar considera não ter sentido essa proibição na região, já que é um local que detém infraestrutura adequada. "Então perguntaram se era possível uma emenda para modificar o índice de aproveitamento no local e eu entendi que sim", diz. Ela afirma que não entendeu o veto do prefeito Rogério Cruz (SD), com argumento da Procuradoria Geral do Município (PGM) de que não seria possível a alteração ao PD. "Outras alterações foram acatadas, mesmo de adensamento. Não sei se tem um viés político ou algo com relação a avenida mesmo."

Para o especialista em planejamento urbano, Gerson Neto, o direcionamento do PD é de adensar os eixos de transporte coletivo, o que não é o caso da Avenida Fued Sebba. "A verdade é que os empresários continuam construindo onde querem. Não há planejamento urbano em Goiânia. Se a lei restringe, eles mudam a lei", acredita. A arquiteta e urbanista e pesquisadora do Observatório das Metrópoles em Goiânia, Maria Ester de Souza, reforça que a avenida é uma via de passagem, usada para a ligação com a BR-153, não sendo necessário o adensamento no local do ponto de vista do planejamento. "O veto foi bem feito neste caso."

Outra mudança acatada pelo Executivo na sanção da lei ligada a ampliação de construções é o aumento do corredor Perimetral-Oeste (ver quadro) e da área de influência da Avenida Perimetral Norte. "Não assusto com mais nada vindo da Câmara. Pegam toda lei complementar e tentam mudar o Plano Diretor. Incluem ruas no corredor Perimetral, liberam todo tipo de uso que perde o controle da cidade", conta Maria Ester. Ela explica que essas alterações aumentam a velocidade da via e autorizam a instalação de grandes empreendimentos habitacionais.

Também houve sanção em relação aos empreendimentos que deveriam apresentar o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), que se trata de um instrumento que demonstra quais alterações a construção de um projeto em determinada área vão ocorrer ao seu redor, com relação a poluição sonora, consumo de água e energia e outros. No caso, os vereadores sugeriram e o Executivo acatou que macroprojetos e locais, ambos comerciais, para reunião de mais de 600 pessoas nas áreas adensáveis e de desaceleração de densidade não precisam mais fazer o estudo.

O mesmo passa a valer para os edifícios públicos, equipamentos urbanos e comunitários nestas mesmas localidades já citadas. Com relação à prorrogação do prazo do Alvará de Construção, o vereador Denício Trindade (UB), autor da emenda, entende que a proposta, embora altere outra legislação já existente, não pode ser considerada uma "jabuti", nome popularmente cunhado a alterações propostas em um documento que não tem a ver com o seu escopo. Segundo ele, a ideia de ampliar o prazo do Alvará de Construção vale para todos os tipos de empreendimentos, incluindo os proprietários que estejam construindo habitações sociais. "A ideia é manter o mercado aquecido, vale para todo mundo, então está dentro da lei, sim. O proprietário hoje pode não estar em condições de construir, então vai ter mais um tempo para ver a melhor hora", diz.

Mudanças não causam melhorias para habitações de interesse social

A arquiteta e urbanista Maria Ester de Souza, que também é professora da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), explica que a ideia de uma legislação sobre a habitação de interesse social (HIS) é trazer alternativas de acesso a moradias para a população de baixa renda. "Teria de tratar sobre como buscar fundos para a habitação, quais tipos de empreendimentos, mas eles pegam a lei para alterar o Plano Diretor", diz ela.

Para a especialista, o documento deveria trazer instrumentos que criassem centralidades na cidade, onde as habitações sociais fossem construídas em locais com comércios e serviços públicos, dificultassem que os empreendimentos fossem fechados e dessem acesso à cidade. "A lei em si, desde o projeto, não traz nenhuma novidade que traga estímulo à HIS e os vereadores ainda pioraram com as emendas."

Entre as propostas relacionadas à lei está a isenção de impostos e taxas relativas aos imóveis em que serão construídas as HIS, como o Imposto de Transmissão inter vivos (ITBI) e até mesmo de Outorga Onerosa de Direito de Construir (OODC). Segundo Maria Ester, estas isenções já constavam no Plano Diretor.

A vereadora Sabrina Garcez, porém, conta que a imposição em lei específica foi uma exigência da Caixa Econômica Federal para que fosse permitida a contratação para construção de projetos dentro do Minha Casa, Minha Vida do governo federal. Os artigos chegaram a ser vetados pelo Poder Executivo sob o argumento de que a isenção de impostos e taxas estaria vedada pela legislação eleitoral neste ano, em razão de ser um período eleitoral e, logo, o Paço Municipal não poderia conceder benefícios para que não incorresse em prejuízo na disputa do próximo mandato. Os vetos foram rejeitados pela Comissão de Constituição e Justiça nesta quarta-feira (3).

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