Dificuldade de achar vaga é falha da mobilidade urbana em Goiânia

Capital possui ao menos 20 regiões em que é difícil encontrar lugar para deixar o carro sem precisar pagar por isso. Especialistas alertam para mudança nas políticas de incentivo
Por Jornal Daqui / O Popular
Data: 06/05/2024
Carros estacionados na Rua 225, no Setor Leste Universitário, que inclui a lista dos bairros com poucas vagas (Wildes Barbosa / O Popular)

Na manhã de quinta-feira (2), a reportagem de O POPULAR rodou por quatorze quadras entre as avenidas T-15, T-4, T-63 e T-10, na região do Parque Vaca Brava, no Setor Bueno, até encontrar uma vaga de estacionamento, já na Rua C-249 do Setor Nova Suíça. Foram nove minutos de tentativa até a desistência de parar o veículo dentro da área desejada, o que seria necessário uma caminhada maior até o ponto de interesse. Na sexta-feira (3), a busca por uma vaga na região da Alameda Ricardo Paranhos, no Setor Marista, durou doze minutos. A expansão urbana, aumento do uso de veículos particulares e a falta de ordenamento urbano faz com que seja, cada vez mais, difícil conseguir um espaço para estacionamento público gratuito.

Junto a motoristas comuns e profissionais (táxis e aplicativos), a reportagem levantou 20 locais da capital em que estacionar é uma tarefa árdua que requer paciência e sorte. Como piores pontos citados estão a região Central, o Setor Campinas (na região da Avenida 24 de Outubro), o Setor Bueno (na região do Vaca Brava e escolas) e o Setor Marista (alta presença de clínicas médicas e de saúde em geral). Despontam também a Praça Universitária e seus arredores e, mais recentemente, as ruas próximas ao edifício Órion, também no Bueno. Este último chama a atenção por ser um empreendimento com grande quantidade de vagas de estacionamento, porém, pagas.

Para especialistas, a melhoria desta situação está em observar a mobilidade urbana em geral e não apenas olhar para a disponibilidade de vagas. Membro da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) e pesquisador do Observatório das Metrópoles em Goiânia, Antenor Pinheiro, explica que “a cidade possui uma das maiores taxas de motorização do Brasil (1,1 habitantes por veículo), o modelo de desenvolvimento adotado privilegia e estimula o uso do transporte individual motorizado como meio de transporte e a política de uso e ocupação do solo corrompe os mais básicos conceitos de planejamento urbano sustentável”.

Com isso, para Pinheiro, “temos como característica prevalente uma cidade cada vez mais brutalizada e violenta, estupidamente gerida, onde o carro e a motocicleta assumem o protagonismo sobre os demais modais”. O resultado, completa o especialista, “são vias cada vez mais saturadas e disputas motorizadas frenéticas por espaços de mobilidade, portanto, uma cidade com menos espaços viários de acomodação para estacionar em função de uma demanda propositadamente aquecida”. Integrante do Fórum de Mobilidade Mova-Se, Jean Damas reforça que o uso indevido dos espaços públicos, como estacionamentos irregulares ou por longos períodos, junto aos demais problemas já citados, evidenciam a situação.

O engenheiro especialista em Trânsito, Marcos Rothen, professor do Instituto Federal de Goiás (IFG), alerta que em Goiânia é possível estacionar de graça na grande maioria das ruas. “Um motorista pode estacionar numa vaga de manhã e deixar o carro ali o dia todo, sem ter que pagar nada. Em áreas com maior adensamento, com maior atividade comercial ou de serviços é preciso que haja a rotatividade com oportunidade para todos os motoristas.” Damas cita que na capital essas são as áreas onde a dificuldade de encontrar estacionamento é mais evidente, como o centro da cidade, bairros comerciais movimentados e locais próximos a instituições de ensino e hospitais.

Segundo Rothen, no entanto, os lugares com maior dificuldade são os setores Campinas, Centro e o Bueno, mas, para ele, mesmo nesses setores é possível estacionar nas proximidades. “E, comparado com outras cidades, os estacionamentos privados, são pouco ocupados, não são muito caros. Algo que se destaca aqui é a possibilidade de até na Praça Cívica estacionar o dia todo sem pagar nada.” Já Antenor Pinheiro entende que os locais com maior dificuldade para se estacionar estão associados “ao interesse e volúpia do capital imobiliário que hoje governa a cidade”.

No seu entendimento, Pinheiro ressalta que o problema “não mais prevalece como dinâmica natural somente nas imediações dos principais polos geradores de viagens, mas como consequência inevitável para todas as regiões adensadas da cidade, inclusive nas áreas residenciais”. Ele faz uma analogia a uma “metástase de uma doença urbana deliberadamente provocada por escolhas irracionais da gestão pública”.

“A receita é enfrentar o problema sob outra lógica, porque estacionamento conceitualmente não pode ser tratado como demanda pública. Estacionar carros e motocicletas é demanda individual, não de interesse público”, acredita Pinheiro. Para Damas, o sistema de estacionamento rotativo, como a Área Azul, pode ser uma solução eficaz e ainda gera recursos.

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