Goiás recicla só 1,7% do lixo coletado

Goiânia está acima da média, recolhendo 3,7% do material; de 246 municípios, apenas 49 têm serviço de coleta seletiva
Por Jornal Daqui / O Popular
Data: 17/05/2024
Lorena Zemir, da cooperativa Fênix Carrossel: média mensal de 120 toneladas de material recebido (Wildes Barbosa / O Popular)

Apenas 1,7% dos resíduos sólidos urbanos coletados em Goiás são reciclados. Do total de 246 municípios no Estado, 49 possuem o serviço de coleta seletiva formalizado pelas prefeituras. As informações constam em levantamento da Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema) de 2023. Representantes de cooperativas que atuam com a separação dos materiais recicláveis na capital apontam que falta conscientização sobre o processo da reciclagem, além da valorização do serviço prestado pelos catadores.

A análise feita pela associação que reúne empresas responsáveis pelo gerenciamento da coleta e destinação dos resíduos sólidos tem como base as informações do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS). O levantamento visa mensurar como os municípios brasileiros estão aderindo às metas da Política Nacional de Resíduos Sólidos, prevista em lei federal de 2010. Mas, em relação à coleta seletiva, os dados demonstram que ainda há muito a se avançar.

Considerando apenas Goiânia, o porcentual é relativamente elevado: 3,7%. Na capital, a coleta seletiva é feita pela Companhia Municipal de Urbanização (Comurg) e os materiais descartados são encaminhados a 13 cooperativas parceiras da Prefeitura. O serviço, entretanto, está em processo de repasse ao Consórcio Limpa Gyn, que assumiu em abril três serviços antes feitos pela companhia -- além da seletiva, a coleta de lixo e a remoção de entulhos. A partir de junho, toda a coleta de materiais recicláveis estará terceirizada no município.

Conforme os dados da Comurg, em 2023 foram recolhidas 30.402 toneladas de recicláveis, o que equivale a uma média mensal de 2.533 toneladas. A empresa aponta que nos últimos anos houve um "significativo avanço" no recolhimento dos materiais, considerando que, no ano passado, houve aumento de 4,8 mil toneladas enviadas às cooperativas em relação a 2022. "A média mensal de recolhimento passou de 2.157 para 2.533 toneladas, quando comparada aos anos de 2022 e 2023, representando uma significativa redução na quantidade de resíduos enviados para aterros", destaca, em nota.

Presidente da Abrema, Pedro Maranhão aponta que a coleta de materiais recicláveis ainda tem abrangência muito baixa, uma realidade observada não apenas no Estado, mas em todo o Brasil. "Como incentiva a reciclagem se o produto reciclado é mais caro? Nós temos de discutir a questão tributária. Esse produto já foi taxado lá atrás, não tem incentivo à reciclagem, tem de dar sustentabilidade (ao processo) para poder avançar. Se não tiver viabilidade econômica, ninguém vai querer. Mas, se tiver, todo mundo se interessa", diz.

Já o presidente da Federação Goiana de Municípios (FGM), Haroldo Naves, adianta que a coleta seletiva tem aumentado gradativamente nas cidades goianas nos últimos anos. "Hoje grande parte dos municípios já vem fazendo a coleta seletiva, nem que seja parcial. A imensa maioria está implantando e tem avançado muito", comenta.

Recicle

A discussão sobre a importância da reciclagem não é recente, mas ainda é preciso avançar mais na conscientização da sociedade. É o que aponta a engenheira ambiental e assessora de sustentabilidade do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Goiás (Crea-GO), Wanessa Rocha. Para ela, o baixo índice de reciclagem no País é preocupante. "Cerca de 4% por ano é reciclado no Brasil, enquanto a maioria é descartada em aterros sanitários ou até mesmo em locais inadequados, como lixões, contribuindo para a poluição do solo, da água e do ar. É crucial que cada um de nós assuma a responsabilidade de contribuir para a reciclagem e o correto gerenciamento dos resíduos", pontua.

Wanessa cita que a população pode começar ainda em casa a fazer separação adequada dos resíduos que podem ser reciclados -- plástico, papel, metal e vidro (veja quadro na página ao lado). "Isso facilita o processo de reciclagem e evita a contaminação dos materiais", destaca. Mas, antes de descartar, é preciso que os materiais sejam lavados e estejam secos. Depois do procedimento inicial, o morador pode consultar se há serviço de coleta seletiva porta a porta no município onde reside. Mas, caso não, também é possível juntar e levar todos os resíduos até os pontos de coleta locais.

"Além de reciclar, a população precisa reduzir o consumo de produtos descartáveis e optar por alternativas mais sustentáveis e duráveis. Pequenas mudanças em nossos hábitos de consumo podem fazer uma grande diferença a longo prazo. Ao adotar essas práticas simples em nosso dia a dia, podemos contribuir para a construção de um futuro mais limpo e sustentável. É importante lembrar que cada gesto conta", acrescenta a engenheira ambiental.

E nesta sexta-feira (17), quando se celebra o Dia Mundial da Reciclagem, iniciativas do setor privado buscam incentivar o reaproveitamento dos materiais descartados. Um exemplo é o Programa E+ Reciclagem da concessionária de energia elétrica Equatorial Goiás, que tem trocado materiais recicláveis por descontos na fatura de energia. Desde que iniciou a prestação de serviço no Estado, em janeiro de 2023, a concessionária aponta que já foi coletada cerca de 1,3 mil tonelada de materiais recicláveis, gerando R$ 375 mil em descontos aos usuários.

"Corresponde a uma economia de 6.406.261,60 kWh na fabricação e processamento dos materiais. Essa quantidade de energia economizada seria suficiente para suprir a demanda por energia elétrica de mais de 40 mil casas na capital por um mês", destaca a concessionária, em comunicado à imprensa. São aceitos resíduos como livros, revistas e jornais, garrafas PET, PVC, materiais de alumínio e de vidro, além do óleo de cozinha. Ao todo, são 12 pontos de coleta em todo o Estado.

Reciclagem gera renda e emprego

Logo após os materiais recicláveis serem coletados nas portas das residências pela Companhia Municipal de Urbanização de Goiânia (Comurg), eles são encaminhados a 13 cooperativas de catadores de materiais recicláveis parceiras da Prefeitura. Lá, os trabalhadores fazem a triagem e a separação do material que pode ser reciclado, a prensagem de todo o montante, e em seguida o destina para a comercialização. E todo o processo é facilitado aos catadores quando os moradores contribuem com a separação correta.

Há 11 anos atuando na área da reciclagem, a presidente da cooperativa Fênix Carrossel, situada no Setor Santos Dumont, Lorena Zemir, comenta que o local recebe uma média mensal de 120 toneladas de material -- calculado após o processo de triagem. Para ela, entretanto, ainda há vários gargalos.

"O preço do material é muito baixo, e tem feito cair a renda (dos catadores). A educação ambiental precisa ser ampliada, e mais engajamento do Poder Público na gestão dos resíduos, principalmente na coleta seletiva. A reciclagem gera emprego, renda e dignidade para muitas famílias que são pessoas de alta vulnerabilidade social. A maioria são mulheres, mães de família", diz, ao informar que há ali 27 trabalhadores.

"O processo de reciclagem é um tripé ambiental, social e econômico. Alivia o aterro (ao levar menos resíduos), economia de energia. Tem toda uma cadeia importante: da cooperativa vai para outras empresas menores, que empregam várias famílias, e depois para a indústria, para dar trabalho para várias outras."

E este entendimento também é compartilhado pela presidente da Cooper Rama, situada na Chácaras Recreio São Joaquim, Dulce Vale, que atua há 18 anos no local. Para ela, falta incentivo do Poder Público para os prestadores deste serviço. "Hoje fazemos isso e não somos remunerados. Estamos assumindo uma responsabilidade do município, precisamos ser contratados", opina. Ela acrescenta ainda sobre a educação ambiental. "As pessoas nem imaginam que algo é reciclável. Se elas não sabem, temos que fazer chegar. Porque pensam 'destinar o que? Para que?'. Nem sabe que vai para as cooperativas, que gera renda. Enquanto não tiver conscientização sobre a importância da reciclagem vamos ficar estagnados."

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