Bancada goiana se divide sobre projeto de lei de armas, mas vê ‘barreira’

Deputados variam entre a defesa e o ataque à proposta que autoriza estados e o DF a legislarem sobre porte e posse, admitindo que inconstitucionalidade não foi superada
Por O Popular
Data: 02/05/2024
Ismael Alexandrino (PSD): favorável ao projeto, deputado critica o governo (Zeca Ribeiro / Câmara dos Deputados)

Deputados federais por Goiás, da base e da oposição ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), apontam uma “barreira constitucional” para a aprovação de projeto que permite aos estados legislarem sobre o porte e a posse de armas de fogo. A proposta de lei complementar foi aprovada por uma margem apertada na última semana pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados e segue em trâmite.

Os parlamentares se dividem quanto ao mérito do texto, apresentado pela deputada e presidente da CCJ, Caroline de Toni (PL-SC), mas confirmam avaliação de que a permissão para uso civil de armas, assim como questões de segurança nacional, são definidas pela Constituição Federal como assuntos de competência restrita a leis federais. Por isso, apontam que a alteração da prerrogativa deveria ser realizada por meio de Proposta de Emenda à Constituição (PEC).

“É inconstitucional”, define José Nelto (PP). “Não compete aos estados legislar sobre matéria que é de competência do Congresso Nacional. Quem pode permitir posse e porte de arma é o governo federal e não os outros entes. Deveria ser por uma PEC, já que uma lei complementar não dá essa legitimidade para os estados”, afirma.

“Bom seria se tivesse uma legislação federal, uníssona, razoável e que respeitasse o Referendo de 2005 no Brasil, em que 63,94% dos brasileiros optaram por permitir aos que quisessem e fossem aptos pudessem tê-las”, aponta Ismael Alexandrino (PSD), que diz ser favorável “tanto à posse quanto ao porte de armas”.

Governistas da bancada goiana apontam que o projeto, defendido pela oposição direitista, não devem encontrar maioria de votos para a aprovação em plenário. “É um projeto que vai contra também a jurisprudência do STF. Não contribui com o aprimoramento da legislação. Soa mais como provocação”, afirma Rubens Otoni (PT). O petista acredita na rejeição ao lembrar da votação apertada já na CCJ.

“Essa é uma pauta ideológica apenas para jogar para a plateia”, afirma Nelto sobre o mérito da proposta, que busca ampliar a possibilidade de liberação de armas para a população civil. “É preciso ter cautela para votar esse tipo de pauta ideológica, seja da direita ou da esquerda. Há inclusive casos de tráfico de armas que é originado com esses CACs (Caçadores, Atiradores e Colecionadores). Já vimos diversas operações que comprovam isso. Então, o Congresso precisa ter responsabilidade”, aponta o pepista.

A deputada federal Adriana Accorsi (PT) também não acredita na aprovação do texto em plenário. “É um projeto inconstitucional e ilegal. Não vai prosperar porque desrespeita a própria Constituição”, afirma.

Para a parlamentar, que é delegada, o projeto não tem objetivo real de aumentar a segurança dos brasileiros. “São parlamentares que não aceitam a derrota do projeto de país que defendiam e ficam agora criando essas situações. O projeto que venceu as eleições foi o do controle responsável do armamento no Brasil. Esta responsabilidade é do Poder Público Federal e está sendo colocada em prática”, defende.

Contraponto

Por outro lado, parlamentares goianos da bancada conservadora têm entendimento diferente e antecipam que votarão a favor do projeto de lei complementar, que está apto para ser incluído na pauta do plenário.

Praticante de tiro esportivo, Alexandrino critica a atual normatização do tema. “Infelizmente, o que rege a matéria atualmente é um decreto e uma portaria ideologicamente contrários, sem qualquer compromisso com a técnica, distante da realidade e que afronta a Lei Geral do Esporte”, considera o deputado, atual campeão brasileiro de tiro esportivo, na categoria de 600 jardas.

Alexandrino faz referência ao decreto 11.615/2023 e à portaria 166/2023, assinados pelo presidente Lula para cancelar as liberações concedidas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Apesar de defender o acesso de civis às armas, o deputado do PSD admite que há barreiras para a aprovação do atual projeto de lei complementar.

“Quanto ao mérito, sou absolutamente favorável ao PLP 108/23, que propõe que cada estado legisle sobre defesa pessoal, práticas desportivas e caça. Quanto à constitucionalidade do instrumento, que vem por projeto de lei e não Emenda Constitucional, penso que ele pode encontrar barreiras”, afirma Alexandrino, destacando a questão da legalidade.

Já o deputado Zacharias Calil (UB) reforça o discurso armamentista como alternativa para a segurança pública. “Eu sou a favor que a pessoa possa ter uma arma para defesa pessoal. Os bandidos estão armados e a gente dentro de casa fica sem arma? É complicado. Essa é minha posição”, afirma. “Claro que sou médico e me preocupo com possíveis consequências de um exagero disso, principalmente no ambiente urbano. É preciso ter cautela para definir as regras, mas isso é uma necessidade, principalmente no ambiente rural”.

Zacharias adota a defesa por maior autonomia para que os estados possam definir leis próprias sobre o tema. “Sei que há questionamento em relação à Constituição, mas em outros países, como nos Estados Unidos, cada estado tem seu poder de legislar. Então, acho que não pode ser uma exclusividade só do Congresso. Tem estado que vai aceitar e outros, não. Goiás seria um estado que passaria uma lei assim, tranquilo”, avalia.

O deputado do União Brasil admite as barreiras constitucionais do projeto, mas aponta que, no mérito, a proposta tem capacidade de encontrar a maioria dos parlamentares. “Tinha que ser por uma PEC. Por conta dessa questão da inconstitucionalidade, não deve ir para frente. Mas o projeto tem potencial para passar. Não sei se o governo tem hoje maioria para derrubar isso. Até porque a maioria lá é de pessoas que têm essa representatividade, principalmente do agronegócio”, considera Zacharias.

O texto foi aprovado na comissão com 34 votos favoráveis e 30 contrários, depois de seguidas tentativas de manobras regimentais por deputados da base do governo. O deputado Patrus Ananias (PT-MG) apresentou voto em separado pela inconstitucionalidade da proposta, com avaliação de que “estados e DF podem complementar residualmente a legislação federal”, mas não podem ter “um cheque em branco para legislar de maneira diversa à legislação nacional”.

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